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Cientista estuda emoções através da própria paralisia facial







A mulher estava com medo e sozinha, uma alma frágil numa cadeira de rodas que tinha colocado algumas coisas num saco de lixo antes de ser desalojada.

Como muitos dos refugiados do furacão Katrina que atingiu Baton Rouge, Lousiana, no verão de 2005, ela precisava de mais que apenas alimentos a abrigo. Ela precisava de companhia, compaixão - alguém, qualquer pessoa, que visse e sentisse sua perda , então buscou esses sentimentos no rosto de sua assistente social, em vão.

Mas a assistente social, recém-formada, parecia tocada emocionalmente de alguma forma. Algo estava errado. "Eu via a diminuição da ligação emocional entre nós, eu via isso acontecendo e não podia fazer nada", disse Kathleen Bogart, 28 anos, assistente social que agora é pesquisadora da área de psicologia na Tufts University. Bogart é portadora da síndrome de Moebius, uma condição rara e congênita que causa paralisia facial e que recebe esse nome por causa do neurologista do século 19 que a descobriu.

Ela conta que, quando as pessoas que ela ajudava expressavam tristeza, "eu não podia retribuir. Eu tentava fazer isso com palavras e tom de voz, mas não adiantava. Sem a expressão facial, a emoção simplesmente morre aqui, sem ser compartilhada. Ela simplesmente morre".

Pesquisadores sabem há muito tempo que as expressões faciais são essenciais para a interação social e as categorizaram em detalhes. Eles sabem que expressões são universais; conseguem distinguir diferenças mínimas em expressões; por exemplo, entre um sorriso por educação e um autêntico.

Mesmo assim, uma questão permanece: como o cérebro interpreta as expressões dos outros tão rapidamente e com tanta precisão? A resposta provavelmente é de grande importância, dizem os especialistas, tanto para entender como as interações sociais ocorrem de forma suave e como elas podem ser problemáticas.

Estudos realizados até o momento apontam para o que psicólogos chamam de imitação facial. Durante uma troca social, as pessoas subconscientemente refletem a surpresa, repulsa ou alegria umas das outras - e, na verdade, interpretam a emoção ao sentir o que está incorporado em seu próprio rosto. Em resumo, sobrancelhas franzidas comunicam tanto quanto um sorriso, e transmitem sua própria carga emocional. Mas e se uma pessoa não consegue imitar nenhuma expressão?

Num novo estudo, o maior até hoje sobre a síndrome de Moebius, Bogart e David Matsumoto, psicólogo da San Francisco State, descobriram que pessoas com o distúrbio, independente de suas dificuldades sociais, não tiveram dificuldade nenhuma em reconhecer expressões de outras pessoas. Eles se saem tão bem quanto pessoas sem a síndrome na identificação de emoções de rostos em fotografias, apesar de não conseguirem imitá-las.

As descobertas sugerem fortemente que o cérebro tem outros sistemas para reconhecer expressões faciais, e que pessoas com paralisia facial aprendem a tirar vantagem deles. "Parece provável que eles desenvolvam estratégias compensatórias em resposta à deficiência de longo prazo", Tanya Chartrand, psicóloga da Duke University que não esteve envolvida no estudo da síndrome de Moebius, escreveu em mensagem de e-mail. "Essas estratégias não dependeriam do processo de mímica e permitiria a essas pessoas entender as emoções através de um caminho diferente".

Se essas estratégias forem capazes de serem ensinadas, afirmam especialistas, poderiam ajudar outras pessoas com certa incapacidade social, seja devido à ansiedade, problemas de desenvolvimento como autismo, ou causas comum de paralisia parcial, como a facial.

"Eu não tinha nenhum interesse específico em estudar paralisia facial, embora fosse portadora; havia muitas outras coisas que eu poderia ter feito", disse Bogart, em sua sala da Tufts. "Porém, na faculdade, busquei ver o que psicólogos tinham a dizer sobre isso, e não havia nada. Muito, muito pouca coisa sobre paralisia facial. E eu fiquei bem, fiquei com raiva".

A emoção a fez fechar o punho, endireitar o tronco e correu até os olhos, sem passar pelo rosto: "Raiva. Pensei que era melhor eu começar a estudar isso, porque com certeza ninguém iria fazê-lo".

A síndrome de Moebius não tem causa conhecida. Ela atinge menos de uma em cada mil crianças no nascimento, resultando em paralisia facial total ou quase total. Na maioria dos casos, os olhos não piscam e a íris só se move para cima e para baixo, roubando dessas pessoas olhares de soslaio e todo um vocabulário de olhadelas e virar de olhos. As provocações tendem a começar logo cedo na infância e se acumular, e ninguém consegue ver a vergonha ou a dor na pessoa que é alvo das brincadeiras. "É como ter uma deformidade e não puder se comunicar, tudo isso de uma vez só", disse Bogart.

A maioria das pessoas com essa condição se adapta. "Assim como no caso dos cegos, cujos sentidos de tato, olfato e audição se tornam mais afiados", disse Matsumoto. "O mesmo acontece aqui, eu acho, só que no domínio da comunicação não verbal".

Nos primeiros dois estudos, Bogart e Matsumoto fizeram com que 36 pessoas com síndrome de Moebius olhassem para 42 fotografias online padronizadas de expressões como raiva, alegria e tristeza. Os participantes identificaram corretamente as expressões cerca de três quartos das vezes - o mesmo índice de adultos sem a síndrome. Seu nível de paralisia não esteve relacionado ao desempenho.

Os resultados não significam que a socialização é fácil ou natural para pessoas com esse tipo de paralisia; a maioria tem dificuldades. Bogart e Matusmoto descobriram num estudo de acompanhamento que a principal razão para isso (além das feições imóveis, que distraem algumas pessoas) tem pouco a ver com uma incapacidade de reconhecer emoções nos outros.

A razão provavelmente tem a ver com a imitação, ou a falta dela. Numa série de estudos, psicólogos descobriram que a conexão social entre parceiros de uma conversa depende fortemente de um "toma lá, dá cá" rítmico e geralmente subconsciente de gestos e expressões que criam um tipo de boa vontade compartilhada. "Parte disso pode ser a aceitação da própria interação", disse Chartrand.

Se o timing não for certo - o estudo sobre a síndrome não considerou o timing -, a aceitação pode ser incerta e a interação falha. A forma como muitas pessoas com paralisia completa, ou quase completa, superam esse problema é confiando em canais além do rosto: olhos nos olhos, gestos das mãos, postura e tom de voz. Muitas pessoas com paralisia podem tornar esses instrumentos expressivos algo sutil ou potente.

"Encontrei minha voz, literalmente e figurativamente, com a fonoaudiologia", disse Matthew S. Joffe, diretor de serviços estudantis do LaGuardia Community College e terapeuta particular, que tem síndrome de Moebius. Joffe descreveu sua paralisia como pronunciada, "com uma boca que fica aberta e um lábio inferior pendurado".

"Eu uso muito humor", ele disse. "É uma forma de mostrar minha humanidade, em primeiro lugar, e ao longo dos anos as pessoas têm dito que minha risada é ótima. Eu rio do fundo da barriga, tenho muitas risadas diferentes para cada ocasião, e cada uma tem uma aparência distinta no meu corpo. Aprendi desde muito cedo que, devido aos duros padrões que a sociedade impõe, se eu não rir das coisas as pessoas provavelmente vão entrar em colapso".

Bogart também tem uma risada marcante. Seu queixo cai, os lábios se esticam e levantam levemente, e todo seu tronco balança. A necessidade de depender desses canais periféricos torna pessoas com paralisia especialmente sensíveis a esses sinais nos outros. "Numa festa, acho que consigo dizer se vale a pena conversar com uma pessoa em alguns segundos", ela disse. "Consigo ler o nível de conforto de uma pessoa, ou se elas conseguem trabalhar o desconforto, muito rapidamente".

Alguns psicólogos afirmam que as evidências de pessoas com paralisia e sem paralisia sugerem que o cérebro sintoniza em vários canais de uma vez quando ler as vibrações emocionais dos outros. A imitação certamente é um deles - mas precisa de uma ajudinha.

Num experimento publicado no ano passado, pesquisadores holandeses fizeram com que 46 estudantes da Leiden University formassem duplas para uma interação de 3 minutos com um colega que ou mentia, ou estava contando a verdade sobre uma doação feita a uma instituição de caridade. Os alunos que seguiram a orientação de não imitar as expressões de seu parceiro de conversa se saíram muito melhor em determinar quem estava dizendo a verdade do que os alunos orientados a imitar, ou que não receberam nenhuma orientação. "A imitação, seja espontânea ou produto de uma orientação, atrapalha a pessoa que tenta fazer uma avaliação objetiva" dos sentimentos reais do outro.

Os gestos e tons dos quais as pessoas com paralisia são tão adeptas trazem mais informações. "E achamos que pode haver outros sistemas também, em áreas pré-motoras do cérebro, que estão compilando toda essa informação" para que o córtex possa fazer um julgamento sobre a emoção, explicou Matsumoto.

Eu seu projeto atual de pesquisa, Bogart está gravando vídeos de dezenas de interações sociais com pessoas portadoras de vários tipos de paralisia, não apenas a síndrome de Moebius, mas também a paralisia de Bell, que muitas vezes congela metade do rosto, e lesões nervosas.

"A ideia é mostrar as entrevistas a pessoas para ver quais são suas expressões, desmembrar todos os elementos do rosto, voz, gestos, para observar o que é percebido pelas pessoas como positivo ou negativo", ela disse. "A ideia é que, se pudéssemos aprender quais são as melhores técnicas de comunicação não verbais, poderíamos ensinar às pessoas com dificuldades de sociabilizarão por qualquer motivo".


Espero que você tenha gostado do texto.

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